sexta-feira, 30 de abril de 2010

Uma morte parcial

Meu suor fazia uma cachoeira sobre aquele papel, todo o calor que o sol emitia estava sendo absorvido pela roupa preta que usávamos. Era um absurdo, tantos dias fresquinhos e justo no que eu to vestido todo de preto, faz um sol de quarenta graus. Nunca fui fã de enterro, pelo contrário, desde criança sempre arranjei uma desculpa pra não ir. Ambiente pesado, pessoas chorando, e ainda por cima com essa maldita roupa preta. Sem contar esses papeizinhos que eles nos dão para acompanhar o padre, enquanto ele fala (detalhe que ninguém presta atenção no que ele realmente está dizendo, mas ao ouvirem a voz dele,seja ela qual for, disparam a chorar).
Roberto era nosso colega de trabalho e faleceu ao ver que suas dívidas equivaliam ao triplo daquilo que ele ainda estava juntando. Seu coração sempre foi fraco, era diabético e tinha um histórico recheado de pessoas que enfartaram na família. Ao receber a conta, Roberto não resistiu.
Sorte, que ele não possuía filhos ainda, e nunca tinha sido casado. Roberto era muito aplicado no trabalho e achava bobagem essas historinhas de pai de família.
Com certeza depois daquele dia a empresa nunca mais foi à mesma, não que ele fosse bem humorado, pelo contrário, era raro você ver um sorriso no rosto de Roberto. Mas apesar disso, sabíamos que ele era uma boa pessoa e que não fazia isso por mal, era o jeito dele mesmo. Lá no fundo da sala era onde ele passava vinte e três horas do seu dia se não às vinte e quatro. Ali, tinha um computador, algumas canetas e papéis, uma mesinha, e um pequeno abajur. Era o suficiente para surgirem grandes projetos, que com certeza, seriam os melhores.
A empresa teve um prejuízo enorme com a perda de Roberto. Ele era a cabeça chefe, era quem criava,explicava e finalizava. Já estava vendo a hora de tudo aquilo ir por água abaixo, até que fomos avisados de que ocorreria uma substituição, e nesse caso, eu entraria no lugar dele. Confesso que de início achei estranho e um tanto quanto desafiador. Sentar-se à mesa em que Roberto sentava pegar na caneta de Roberto, foram mais difíceis do que eu imaginava. Mas de acordo com o tempo fui esquecendo todas essas paranóias e fui fazendo meu trabalho. Estudei muito para tentar chegar aos pés do que ele fazia, mas ó, ta difícil. Graças a Deus consegui recuperar o nome da empresa, que já estava indo de mal a pior. Os sorrisos e as pessoas falando tranquilamente voltaram a fazer parte da nossa rotina.
De pouco em pouco parece que tudo está voltando ao normal. Tenho um carinho enorme por todos nesse trabalho. Talvez eu não percebesse tanto isso, mas foi quando eu mais precisei que eles estavam lá, dizendo um gentil “você consegue”. Grande parte do que consegui, agradeço segundamente a eles, com certeza.
Primeiramente agradeço a Roberto, por ter me incentivado e me forçado a melhorar. Sabe, às vezes não precisamos que pessoas fiquem nos falando isso, no caso de Roberto era uma questão de honra tentar manter um padrão que ele sempre tentou manter, com dedicação e vontade.
Na salinha que era dele, e que agora é minha, tinha uma cafeteira também, que eu nunca encostei o dedo (tenho alergia a café), mas que Roberto amava. Às vezes sabíamos que ele tinha chegado, pelo cheiro do café.
Tenho certeza que Roberto deve ta me vigiando em um outro lugar, vendo se eu to fazendo tudo direitinho. Afinal mesmo eu sabendo que eu nunca vou tomar café, e que nunca ninguém do trabalho, entra na minha sala sem pedir permissão, a cafeteira nunca parou de fazer aquele café, nenhum dia. Deixando o mesmo cheiro que sempre deixou. Vai entender...


Úrsula Castro

quarta-feira, 28 de abril de 2010

No more .

De certa forma ela não queria mais dizer, mas as suas perdas e as suas vitórias se fechavam em um quarto escuro, muito pouco visitado . Do jardim ela olhava aquela pobre janela , envelhecida , empoeirada , assustadora e irremediavelmente fechada.
Seu sonho era sair do lado de fora e ir de vez abrir aquela maldita porta . Ou então tacar uma pedra na janela,deixando que o ar leve,vivo e claro renovasse o clima denso , denso e frio daquele quarto .

Ela esperou por meses , anos , vidas ...
Foi quando enfim , levantou do balanço e pegou a primeira pedra , a maior de todas do jardim .
Sem pensar duas vezes arremessou diretamente na janela ...
O silêncio decepcionou , a mágoa alertou . Já não havia mais casa , nem janela , nem pedra , nem ela ...
O tempo trancou a porta e o sonhos ficaram nela .


Úrsula Castro

terça-feira, 27 de abril de 2010

E a receita se perdeu ...

Eu sou do tempo do cinematógrafo, uma espécie de ancestral da filmadora,onde 40 minutos de projeção eram bastante complicados. Eu sou do tempo dos grandes nomes como, Max Linder que mais tarde inspiraria Charles Chaplin, o primeiro tipo cômico, Louis Feuillade com o “Fântomas”, primeiro seriado policial e Antônio Leal com “Os estranguladores”. Eu gostava do cinema mudo, me deixava curioso e instigava a minha imaginação. Lembro-me perfeitamente que eu voltava para casa tão maravilhado, que sonhava com as possíveis falas de cada personagem.

Eu vi Hollywood surgir, e junto dela seus famosos Anos Dourados. Eu vi Casablanca, Nosferatu, Drácula, Frankenstein, E o vento levou, O maravilhoso mágico de Oz, todos os clássicos da disney, Alô Alô Carnaval dentre milhares de outros...

Hoje em dia já não vejo quase nada , a não ser clone dos clones , paisagem das paisagens , amor dos amores , eu digo , a falta de originalidade ! Um delírio meu ou pura vaidade ?


Úrsula Castro