terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Geração do silêncio

Foram oito anos longe daqui. Embora em papéis picados, guardanapos aleatórios e alguns cadernos misturados ainda houvesse inúmeros registros. Sentar aqui novamente é como reencontrar um velho amigo e não saber exatamente como começar a conversa.E talvez a forma mais prática de começar seja pelo passado. Ou de onde tudo parou. Voltei a ler algumas lembranças que essa plataforma diabolicamente incrível proporciona, chamada Facebook. E nessas lembranças me assustei. Me assustei porque era exatamente eu mesma, eu mesma de agora, que poderia ter escrito aquilo. E que de alguma forma eu não tinha maturidade ou sequer experiência de contato, de amor, de decepção ou das mais dolorosas vertentes de um ser humano. E como numa espécie de premonição eu sempre escrevi, aquilo que hoje eu escreveria também. Com a única diferença: há oito anos atrás eu deduzia. Hoje, eu sei. Foram anos conturbados, a ponto de eu finalmente me aceitar como uma pessoa conturbada. Eu me formei em jornalismo, namorei por muito tempo e sofri a ponto de achar que a vida tinha me confundido com um saco de pancadas. Foram cerca de dez a quinze mil instabilidades, alegrias seguidas de tristeza, porres e risadas, porres e sentimento vazio, medo, amor e caos. Hoje, faço mais uma faculdade: Psicologia Carrego em mim essa não compreensão de que todos tem que ser iguais. Todos tem que ter uma mesma vida, baseada em normas e leis que Igrejas aplicaram há muito tempo atrás. É difícil pra mim ser aceita até hoje. Assim como é difícil eu perceber que eu não sou tão aceita como eu gostaria. Meus hábitos são colocados como preguiça. Minha liberdade como irresponsabilidade. Minhas ideias como sem cabimento e meus partidos como de oposição. O que eu tenho lido é que somos a geração dos acomodados. Daqueles que não correm atrás. E não é isso que eu vejo. As minhas duas faculdades eram repletas de alunos. Alunos incríveis, que hoje fazem brownie pra vender para novos alunos da mesma faculdade que se formaram há 5 anos atrás. De 20 pessoas que se formaram comigo, 3 trabalham como jornalistas. O resto teve que se virar fazendo qualquer outra coisa. Mas o mais importante, coisa que um acomodado não faz. Hoje mediante a esse péssimo mercado de trabalho, onde engenheiro com pós graduação vira uber, e advogado faz bico no natal em lojas de shopping, é horrível ter que ler que somos "a geração dos que não correm atrás". A gente é a geração do nada. A política é uma bosta, as pessoas estão cada vez mais estranhas, as faculdades estão lotadas, as empresas só colocam conhecidos, as salas de pré concurso estão infestadas de pessoas frustradas com contas pra pagar, filho pra criar, ou apenas querendo sair de casa de uma vez por todas, enquanto esses mesmos concursos só oferecem dez vagas. A geração passada,desfrutou de um outro cenário, uma outra configuração. Cargos emblemáticos, concursos que não fazem prova, empregos onde a beleza era o fator número um , casamento aos 25 anos de idade, ser pai aos 30, ser mãe um pouco antes. Uma casa pra morar, própria, um carro e tudo isso antes dos 40. É de profunda coerência entender que se esses são os nossos pais e os nossos tios, porque nós somos a geração da depressão. Vimos tudo isso desde criança. Crescemos nesse ambiente estruturado, que por mais instável que fosse, nada muito bizarro era visível. E o que temos hoje, é a frustração de querer fazer tudo igual, escutar que podemos fazer tudo igual. Mas não podemos. Alías, já estamos com um delay de 5 anos. A nossa geração está rompendo com toda a base de como um ser humano pode ou deve viver. Nem sempre casar é sinônimo de ter alguém. Nem sempre estar desempregado é sinônimo de acomodado. Nem sempre tatuado é sinônimo de bandido. Nem sempre não engravidar é sinônimo de frieza. Uma das gerações mais dolorosas, mais introspectivas, mais doentes. Existe um silêncio entre os jovens adultos. Existe agonia. Existe peso e falta de direção. Não é fácil ter 28 anos em 2019. Somos muitos. Embolorados numa sala de espera cercada de portas. Somos muitos nos empurrando, cotovelando, brigando, pra tirar esse lugar de perto da porta do outro. A porta abre. Há caos. Alguns entram. A porta fecha.80% continua do lado de fora. Existe tristeza aos que ficam mas ninguém vai embora. Até uma nova porta se abrir colocando mais 5 pra dentro. Enquanto isso. Silêncio. Bem vindos a geração do silêncio.

3 comentários:

  1. Difícil tecer um comentário de palavras tão sobrecarregadas. Me parece que você escreveu por compulsão, que sua mente efervesceu e suas mãos botaram pra fora um turbilhão de coerências amargas. E acredito que você tem razão em cada palavra, cada vírgula.

    Afinal de contas, "O mundo inteiro é um saco de merda se rasgando. Não posso salvá-lo."

    Você é foda. Te admiro pra caralho.

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    1. Que comentário! Que honra!

      Incrível notar que você entendeu perfeitamente a forma e a sombra do texto.

      Eu que te admiro demais, meu amigo.
      Seguimos fortes, nessa insesatez necessária exposta em palavras.



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